Aterro em Luanda e tenho
a aguardar-me, no Aeroporto, o meu amigo Francisco Fontes, irmão do já citado
Noé - que comigo tirou uma fotografia em casa dos meus pais -, e que igualmente
viria a ser meu colega no mesmo Banco, terminando a sua carreira como Gerente
do Balcão da Venda Nova. Transmito-lhe que está tudo bem com a sua família,
entrego-lhe um pequeno pacote de que fui portador e relato a situação do meu
pai. Ele estava por dentro de tudo mas nunca me havia revelado absolutamente
nada. Dirigimo-nos para o domicílio de seu Tio Tono. Fardo-me e dirijo-me
imediatamente ao QG (Quartel-General) para me apresentar na Região Militar de
Angola, a fim de carimbar o Passaporte Militar e, dessa forma, regularizar a
minha situação de retorno à RMA. Fui dispensado de me apresentar nos Adidos uma
vez que a viagem para Serpa Pinto teria lugar daí a dois dias, tempo
aproveitado para gozar Luanda e os seus encantos.
Na Ilha do Mussulo |
Trajando à civil, tomo um
Friendship (avião turbo-hélice) da
DTA para Serpa Pinto, via Nova Lisboa. Para minha surpresa, vejo na Pista de
Aterragem, à chegada àquela longínqua cidade, o Major Ló, também trajando à
civil. E para meu espanto, depois de cumprimentos feitos por ele a algumas
pessoas que comigo viajaram, dirige-se a mim, pôs a mão no meu ombro e diz-me:
“então Mota, como correram as férias?”.
Fiquei admirado por ele ter conhecimento que eu viajava ali e ser sabedor do
meu nome, não pertencendo eu ao seu Batalhão… A minha Companhia encontrava-se
em reforço da sua Unidade mas não lhe era organicamente afeta. Dei-lhe uma
resposta de circunstância e procurei ser afável. “Disparou” de imediato: “É preciso ir rapidamente para baixo pois há
por lá uns problemas que eu quero ver resolvidos com urgência!”. Deduzi ao
que se reportava, pois, antes da minha saída, tinham sido detetadas situações
anómalas quanto a abastecimentos em alguns nossos Destacamentos. Com um ar
respeitoso, disse-lhe eu: “vou já tratar
à CCS do transporte no Cessna, pois quanto mais depressa lá chegar mais
depressa mato o leão!”. Olhou para mim com um ar circunspecto, num misto de
surpresa pelo atrevimento e algo que não estivesse a entender, tentando
adivinhar o sentido dúbio das minhas palavras, e, inteligente como era (é, ele
ainda é vivo), o seu semblante sofreu uma metamorfose rapidíssima: passou do
olhar gélido, tipo “fuzilamento”, para o do sorriso, dizendo, com alguma
simpatia: “a notícia do Luengue chegou
rápida, já estou a ver!”. É que o Carlos Paulo, da Companhia de Cavalaria
2499, tinha abatido um leão no Destacamento do Luengue, o que era absolutamente
proibido. Foi-lhe feita uma ameaça duma punição muito severa, mas, felizmente,
nada aconteceu. Desconheço o destino que foi dado ao cadáver do bicho, desde a
juba até aos ossos …
Feitas as necessárias e habituais diligências na Secretaria da Companhia
de Comando e Serviços do Batalhão de Cavalaria 2870, eis-me pronto para
embarque, no dia aprazado, fardado de
camuflado, no Cessna dos “nossos primos”, de regresso à minha “família militar”.Carlos Jorge Mota
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