Piloto carcamanho muito jovem, de 20 anos, fez a melhor distribuição da
carga, para equilíbrio do avião, como mandam as regras aeronáuticas, colocando
o Saco do Correio atrás, juntamente com as cestas contendo legumes frescos,
arrumou um saco com pertences seus, algum material requisitado pela Companhia e
apetrechos que só à chegada percebi que nos eram alheios.
Decorridos uns bons 90 minutos
após a descolagem, e indo nós numa amena cavaqueira, começa-se a visualizar as
enormes chanas (savanas) a perder de vista, num horizonte mais alargado pela
altitude de voo. De repente, ele, às gargalhadas, “pica” sobre uma manada de búfalos,
passa em voo rasante, e ergue-se de novo nos céus. Já não sei de que lado tenho
o fígado nem o estômago. A cabeça fica tonta de tal modo que entro numa
situação de enjoo aflitivo. Os comandos eram duplos e viajávamos um ao lado do
outro. Tínhamos intercomunicador, de contrário, com o barulho do motor, não nos
ouviríamos, apesar de tão próximos. Digo-lhe como me sinto e ele responde-me,
de pronto: “põe a mão na manche!” E,
inexplicavelmente para mim – ainda hoje me interrogo como é isso possível
-, não é que resultou mesmo? Serenei,
fiquei tranquilo e estável. Então, vai daí, sempre às gargalhadas, resolveu fazer
um quase looping … digo quase porque
ele não fechou o círculo. Perdi por completo o sentido de orientação: já não
sabia onde estava o céu e onde estava a terra … Era um tipo muito simpático,
afável e muito conversador.
Decorridas duas horas de voo,
avistámos, por fim, ao longe, as instalações da Coutada.
Vista aérea da Coutada do Mucusso |
O “pássaro” faz um voo rasante às
copas das árvores e aterra na Pista Nova. Entretanto, ele diz-me para ficar
junto ao avião até à descolagem.
Descarregado tudo que a nós se
destinava, ele faz-me sinal, de novo, para ficar na pista, mas no meio. Descola
num espaço muito curto, sobe, dá meia volta, e, qual o meu espanto, “pica”
sobre mim, que me obriga a atirar-me para o chão. Toma, de novo, um pouco de
altitude, dá a volta, passa novamente, abana as asas, como saudação, e toma o
rumo da sua Base no Rundu. Percebi, então, que o material não descarregado
tinha como destino final aquele território.
Narro ao lº Vilares o que o Major Ló me havia transmitido em Serpa Pinto. Respondeu-me que, na minha ausência, tudo tinha sido já resolvido.
Aconteceu que em alguns Destacamentos tinha sido já detetada, antes da minha partida, uma falta de alguns géneros, incluindo Rações de Combate, tudo surripiado por mãos anónimas e velozes na arte. Constou-se que alguns soldados “compravam” o amor de algumas pretinhas bosquímanas com “aquelas guloseimas”. E como quem comanda é o responsável por tudo que os seus subordinados fazem ou deixam de fazer, foram instalados Autos de Averiguações e, claro, da conclusão tirada, como não se apuraram responsáveis diretos, sobrou para os respetivos Comandantes.
Carlos Jorge Mota
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