Patrulhas sucessivas, consubstanciadas
principalmente nas deslocações ao Dirico e Calai, para abastecimento de
combustível e nas ações de caça, único alimento substancial, normalmente de
gazelas ou gnus, quer por serem os mais abundantes quer pelo sabor excelente da
sua carne. Numa dessas incursões, deparamo-nos com uma manada de centenas de
búfalos, em terreno aberto, em corrida, naquela savana imensa, a uns trezentos
metros. Avistando-nos, pararam e, numa atitude de autodefesa, colocaram-se em
linha, virando-se para nós. Estancámos os Unimogues e ficamos a observar,
receosos que, nessa disposição defensiva, arrancassem em correria. Ficaríamos
em massa disforme. Mas não, recolocaram-se em fila indiana e retomaram a
marcha. Recompostos e aliviados do susto, dirigimos as viaturas para o fundo da
manada na tentativa de isolarmos um animal, mas sempre atentos à reação dos
restantes. A dado momento, um casal, macho e fêmea, foi ficando para trás,
provavelmente já cansadíssimos. Virámos então as viaturas na sua direção,
lateralizando-os, e tentando modificar o sentido da sua marcha, em galope.
Assim aconteceu. Viraram para trás e continuaram a sua correria louca … mas
estavam já isolados. O resto da manada seguiu o seu destino. A dado momento, o
macho, provavelmente não aguentando mais aquela aceleração, parou e começou aos
urros, assustadores. Deixámos a fêmea continuar a sua correria e
concentrámo-nos naquele bicharoco, mais pujante, logo, mais pesado, mais carne,
portanto. Ficamos expectantes e olhamos em redor. Nem uma árvore de grande ou
médio porte, onde nos pudéssemos refugiar para uma eventual situação reativa.
Passados uns cinco minutos, talvez já recomposto e sentindo-se acossado, vemos repentinamente
aqueles seiscentos quilos de carne abaixar os cornos, num berrar horrendo, e
correr na nossa direção, perpendicularmente à posição dos Unimogues. Ficamos
estarrecidos pois ele derrubaria a viatura por si selecionada e desfaria por
completo quem lá fosse instalado. Já a uns dez metros de proximidade, o João
Silva (irmão dum conhecido escritor e jornalista desta praça, César Príncipe, e
que viria a exercer a profissão de Delegado de Informação Médica) dá um alto
berro para o condutor: - ”arranca!”.
O bicho deverá ter-se assustado com o grito e deu uma volta de 90º, mas sempre
em correria. Ficamos amarelos, brancos, sem pinta de sangue. Mas já que éramos
duma Companhia de Caçadores … aí vamos nós novamente na sua peugada. Ele já não
deveria aguentar mais, porque estancou a espumar-se abundantemente. Combinámos
o ponto onde deveria levar o tiro, na parte superior da pata esquerda da
frente, e então abrimos fogo simultaneamente. Ele caiu, aos berros, e, como já
não poderia levantar-se, aproximamos-nos, já apeados, e demos-lhe o tiro de
misericórdia.
Na balança de caça grossa da Coutada deu 623 Kgs |
E agora, como o transportar? Como
se pega num peso daqueles e como o levamos? O desenrascanço tipicamente portuga
logo emergiu: amarrámos o guincho duma das viaturas à cabeça do animal, travado
pelos cornos, e fomo-lo arrastando para junto de uma árvore com sustentação
razoável. Desmontámos o banco de um dos Unimogues e colocámo-lo
transversalmente à frente, junto à chapa de separação do condutor. Encostámos
essa viatura à árvore já escolhida. Passámos o guincho por cima dessa árvore e
fomos içando, devagarinho, aquelas centenas de quilos. O Unimogue foi-o
recebendo no seu seio muito devagar até ficar estabilizado. Algum pessoal
passou para a outra viatura, apertando-se um pouquinho, e o restante sentou-se
no dorso do nosso troféu.
E lá calculámos o azimute correto, quais patrulheiros em serviço, rumo
ao Aquartelamento, sem captura de Inimigos, mas com uma peça especial de
iguaria.Carlos Jorge Mota
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